Pai de primeira Copa

O primeiro Mundial do qual tenho lembranças vívidas é o de 1990. Lembro-me com detalhes da lambança de Higuita contra Camarões, da dancinha de Roger Milla, do surpreendente artilheiro Totó Schillaci, dos pênaltis defendidos por Goycochea (e daquele mais decisivo, que ele não pegou por centímetros).

Mas do que jamais esqueço mesmo é o que vivi fora da televisão. Nas oitavas entre Colômbia e os Leões Indomáveis, como fizemos em várias outras partidas, meu irmão e eu ficamos assistindo de um lado da sala, enquanto meu pai, recuperando-se de uma tuberculose, ficava do outro fazendo tratamento. Mesmo distante – a sala era bastante larga –, ele fazia questão de nos ensinar detalhes da peleja e contar histórias de Mundiais passados.

A finalíssima assisti na casa de minha avó, ao lado de incontáveis tios, tias, primos e primas. Família mineira numerosa. Minha mãe teve 11 irmãos. Era festa da boa. Quase todos estavam torcendo pela Alemanha. Eu, fã de Maradona e cia, era a exceção.

Para mim, futebol sempre foi muito mais do que o jogo. É sobre criar laços, afetos e momentos. Por isso, o Mundial do Catar será diferente de todos os outros aqui em casa.

Conto minha vida em Copas do Mundo. Este ano, completo exatamente 10 Copas de Vida. Será a 1ª do Martin, meu filho. E isso faz tudo ser diferente. Tenho certeza que, assim como foi em 1986 para mim, ele não vai lembrar de nada deste mundial. Mas eu vou fazer questão de recordar todos os detalhes.

Um dia quero contar quais jogos ele conseguiu assistir ao meu lado ou no meu colo. Como foi sua reação com a barulheira da estreia do Brasil. Os lances mais importantes que perdi por ter de correr pela casa atrás dele. Ele vai saber até que a Copa começou com nós três (pai, mãe e filho) isolados por conta da reta final de uma Covid que nos pegou de jeito.

Os gols ele poderá ver depois pelo YouTube – ou por outra plataforma do futuro. Mas dos pequenos momentos, desses ele vai precisar de mim para saber como foi sua primeira Copa de Vida.

Tudo começa no domingo, com Catar e Equador, bem na hora de sua soneca. Mas não há de ser nada. No segundo tempo ele estará acordado para ficar ao meu lado e fazer desta a Copa mais especial de minha vida.

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