Desde o começo da Copa penso nos países que ficaram de fora. Minha lembrança das crianças alinhadas na quadra, aula de educação física, as duas melhores jogadoras iam escolhendo seus times, eu imensa e descoordenada incapaz de acertar a bola, ficava por último, eu não era uma escolha, se houvesse um limite de alunas por time eu ficaria de fora, de fora dessa pequena copa particular que era todo o meu universo.
Agora os dois times em campo, a torcida colorida, pintada, um carnaval de pátrias festivas em coro, fico mesmo pensando nos países que não foram, que tentaram e não conseguiram, se eles ligam as televisões para ver a festa dos outros, a arquibancada gelada da quadra do colégio em que eu sentava sozinha no fim de tarde com um lanche gorduroso assistindo às meninas que sabiam jogar.
Deviam fazer a Copa dos que não foram, uma coisa paralela, cheia de holofotes, gritos de incentivo. As crianças daqueles países nem saberiam para que Copa estão torcendo, seus jogadores emocionados cantando o hino.
E agora começa o que talvez seja ainda pior, a volta pra casa, depois de uma batalha longa, que pode terminar só depois de um doloroso e anárquico chute a gol tão eficiente em rotular culpados, expulsos da festa antes do fim. Quem perdeu o pênalti desce do avião e abraça os filhos que sabem de tudo, sabem que a torcida do país inteiro não gosta mais do seu pai, a fragilidade desses heróis.
Deviam fazer as Eliminatórias Discretas. Vamos jogando, todo o dia um jogo, anotamos quem ganha, vamos seguindo, não precisa eliminar agora, disfarçamos, botamos o time pra jogar com algum da Copa dos que não foram. Deixa para eliminar mais pra frente, quando pouca gente estiver prestando atenção.
Compartilhar:
Mariana Salomão Carrara
Mariana Salomão Carrara é paulistana, nascida em 1986. Tem um livro de contos (Delicada uma de nós) e dois romances publicados (Idílico, e o recente Fadas e copos no canto da casa). Recebeu prêmios nacionais como Off-flip, SESC-DF, Felippe D'Oliveira (2015 e 2016), Sinecol, e Josué Guimarães. Publicou um conto na revista do SESI/SP, outro na revista do SESC-SP e um na Revista Liberdades, do IBCCRIM. Uma primeira versão do romance Fadas e copos no canto da casa foi finalista e menção honrosa no Prêmio Nascente USP-2009. É Defensora Pública desde 2011 e aluna do CLIPE 2018.
Todas as crônicas do autor
Curta nossa página no Facebook e acompanhe as crônicas mais recentes.
Crônicas Recentes.
Joca
22/08/2023
Caio Junqueira Maciel
21/08/2023
Maria Alice Zocchio
20/08/2023
Fátima Gilioli
20/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
20/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
18/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
15/08/2023