Café da manhã

O jogo já estava nos seis minutos quando puxei minha comanda no totem da entrada. À direita do balcão, vi as cadeiras viradas sobre as mesas e tive que seguir para o outro lado. A padaria não tinha qualquer clima de festa para uma estreia na Copa e os concentrados no celular deviam ser os mesmos que, todos os dias, tomam o café antes do trabalho. Numa única mesa, duas adiante da minha, uma moça e dois rapazes olhavam para a TV. Usavam camisetas com um logo de empresa e não iam ficar para os dois tempos. O trio de torcedores, mesmo que acidentais, serviu para espantar uma leve melancolia.

Fiz o pedido e passei a acompanhar a partida como se assistir a um jogo no lugar fosse um hábito de muito tempo. Quando dei a primeira mordida no pãozinho e o primeiro gole na média, o cronômetro já marcava treze minutos. Cinco depois, aos dezoito, saiu o gol do Brasil. Ary Borges, de cabeça, depois de um cruzamento de Debinha. Na mesa dos três torcedores e na minha, um gritinho de emoção. Na porta, o casal que entrava com um carrinho de bebê, desviou a atenção do jogo. Pareciam frequentadores assíduos e a criança, muito à vontade, foi passando de colo em colo entre os funcionários. Por conta do serviço espontâneo de babás, os pais puderam tomar café em paz e de quebra ver o jogo. Quando o trio da firma foi embora, o casal compôs comigo o que restou da torcida.

Demorou até que as outras pessoas percebessem que na TV acontecia um jogo bom de verdade. O Brasil dominava e não era só por conta da fragilidade do Panamá. O que se via era um time com espírito de equipe, amor ao futebol e muita vontade de vencer. Aos 38, outro gol de Ary Borges e um pouco antes uma bela defesa da goleira panamenha. Foram 45 minutos (com só dois de acréscimo) de um jogo bonito e limpo.

No segundo tempo, Ary Borges deu uma exemplar demonstração de espírito coletivo ao dar um passe para trás numa bola que poderia ser sua. Com a jogada, ela permitiu que Bia Zaneratto fizesse o terceiro. A mesma Ary fez o quarto aos 21 e fez a gente aprender, eu pelo menos não sabia, que “hat-trick” não é só uma expressão para carta na manga, mas o nome que se dá quando o/a jogador(a) consegue fazer três gols numa mesma partida. Parabéns, Ary, a mais jovem jogadora a conseguir um hat-trick. Aos 29 minutos, Ary foi substituída por Marta, que entrou ovacionada, não fez o quinto gol ou quem sabe um sexto. A torcida no estádio queria, mas nem precisava. A seleção mostrou que não só começou bem, como tem um time consistente com chances de avançar. Mais que fazer gols, a presença da veterana é importante para trazer confiança a cada jogo.

A partida contra a França não será tão fácil como a de ontem. A defesa trabalhou pouco e Pia Sundhage deve organizar um time mais fechado. O jogo vai ser no sábado às 7 horas. Bem cedo para quem estica o sono no final de semana, mas vou de novo à padaria pra ver se, depois do 4 a 0, encontro gente mais animada. Assim espero. Esta seleção merece muito mais torcida e muito mais festa. Acho que o Brasil também.

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