Celebração das contradições

Às vezes, nada se espera de um jogo. Quando dois times já classificados entram em campo, por exemplo. Quase sempre vira apenas um teste para reservas, ajudando a poupar aquele jogador importante. Cumpre-se a tabela, nada mais. Era esse o espírito sobre o campo apesar dos discursos de técnicos e capitães nas coletivas de imprensa. E quando um dos times é o anfitrião que acredita estar com a bola toda? Bom, aí é motivo de festa! Diriam os russos dispostos a celebrar em plena segunda.

No entanto, em Samara, se houve festa foi dos uruguaios. Nas arquibancadas ou dentro das linhas, estava bonito de ver o azul celeste se apropriando do lugar em que o vermelho deveria dominar. Já no primeiro gol, foi dado o recado: não se iluda! O sol que brilha abaixo do equador tem olhos e enigmáticos sorrisos! Afinal, derrotar donos da bola é coisa que eles sabem, pelo menos essa é uma das histórias que o Maracanã conta para a nossa tristeza e assombro.

Os tempos são outros, naturalmente, mas é visível que os dentes de Suárez nesta Copa estão mais para sorrisos, e que Cavani já demonstra ter vencido uma suposta maldição. Aliás, como em outras artes, os latino-americanos já mostraram toda a sua destreza em lidar com assombrações. O que é o real maravilhoso na Literatura se não um modo de superar o real horroroso de nossos descaminhos?

Três gols são oferecidos para encher de prazer a garganta de torcedores, diria Eduardo Galeano, que em vida soube traduzir com poesia todas as paixões despertadas pelo futebol. Assim como soube sintetizar com maestria as contradições que tem alimentado o viver dos que cedo aprendem fazer dos medos a coragem, e de cada perda, um encontro. Tomo-lhe, de empréstimo, o título. Celebremos!

[25/06/2018 – Uruguai x Rússia, Copa do mundo da Russia, 2018]

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