Relapso cronista deste site que sou, troquei o Mundial Feminino
da França – conforme o combinado – por uma quarta de final da Copa América.
Deixei a televisão ligada, como sempre faço para distrair meu cachorro, no pré-jogo França e Estados Unidos e parti para o Maraca assistir aos marmanjos argentinos e venezuelanos.
Em termos de futebol foi uma péssima troca.
Meu cachorro parece que gostou do que viu. Soube depois que o jogo das meninas foi muito mais emocionante e eletrizante do que o modorrento Argentina 2 Venezuela 0, quando, confesso, passei a maior parte do tempo pensando o que o camisa 10 dos hermanos estaria fazendo ali, diante de uma torcida azul e branca alucinada que operava um espetáculo à parte.
Messi mal tocou na bola, andava em campo, como se esperasse o apito final para voltar para o hotel e ficar olhando para a parede, traço característico de sua personalidade de gênio excêntrico, que suponho, seja extensão do seu comportamento quando veste a camisa da seleção argentina.
Fui assaltado pelo pavor de que o melhor jogador do mundo estaria guardando suas munições para exterminar na próxima terça o Brasil de Tite.
Botafoguenses entenderão a paranoia.
Mas eis que o apito final guardou a maior emoção da tarde noite.
Depois de bater palmas para os argentinos – sim, sou um desportista com fair play – subi para o camarote para o qual fui convidado, aceitei de gentis garçons uma taça de vinho branco e alguns acepipes (não, não eram asseclas, segundo o parco vocabulário do Indigníssimo Ministro da Educação), quando vi sentado numa mesa, rodando o dedo no gelo de um copo de Red Label, nada mais, nada menos do que Jairzinho.
Sim. O camisa 7 da minha seleção brasileira maior, estava ali, a dois passos do meu encantamento.
De esguelha, ouvi seu jeito carioca conversar com uns amigos,
algo como se ele quisesse desafiar a Marta a receber um lançamento de 50 metros, matar a bola no peito, dar lençol no zagueiro, ganhar de um outro na corrida, enganar o goleiro e fuzilar no canto esquerdo do gol, fazendo a rede aconchegar a
bola com todo carinho. Pronto. Era descrição de um de seus gols contra a Checoslováquia em 70, cuja imodéstia da maturidade consciente fez relembrar seus feitos e me transportar aos meus
17 anos.
Não resisti.
– Jairzinho, com licença, sou botafoguense…
– Nós somos.
– Posso tirar uma foto com você?
– Uma honra.
Ele se levantou, nos abraçamos e o momento foi eternizado pelo celular da minha filha.
– Muito obrigado por tudo, Jairzinho. Por tudo mesmo.
– Eu é que agradeço por você ter me reconhecido.
Hein?
Ah, parabéns, meninas norte americanas. Pelo talento, pela tática, pelo preparo físico, pela paixão em jogar futebol. Enquanto as francesas choravam lá e eu me emocionava aqui por íntimas razões, vocês pulavam de alegria em direção a mais um título mundial. Aposto. Meu cachorro tem um bom faro.