OVERDOSE SADIA

Época de Copa do Mundo é tempo de empaturrar-se de futebol. Quem pode, mergulha na orgia desmedida, entrega-se à gulodice luxuriante, mete o pé na jaca. São futebóis, pátrias de chuteiras, apoteoses múltiplas por mais evidentes que sejam as distorções e interesses escusos que normalmente solapam as relações.
No momento em que escrevo essas linhas, metade das Oitavas de Final da Copa do Deserto já está definida e entre as equipes classificadas, está a Argentina, que passou um vexame na estréia perdendo para a Família Saud, que manda e desmanda em seus domínios. A Argentina não apenas classificou-se em primeiro lugar como jogou um bom futebol, envolvendo a Polônia que só tem goleiro e centroavante. A Argentina aproveitou que o time adversário, não existiu em campo e deitou e rolou. Com exceção dos dois citados, a Polônia se resume a um grupo de gigantes que possuem afinidade com um monte de coisas, menos com uma bola de futebol. Essa geração de poloneses tem uma relação difícil com a pelota esférica e isso é surpreendente, pois a Polônia já fez bonito pelos campos, com jogadores de qualidade como Jan Tomaszewski (goleiro), Bolesław Lato, artilheiro da Copa 74, na Alemanha, Ernest Pohl (atacante), Kazimierz Deyna (atacante), Zbigniew Boniek (meio campista), entre outros.
Quem viu esse bando de pernas de pau contra a Argentina, morrendo de medo da bola, não imagina que a Polônia já foi por duas vezes terceira colocada em Copas do Mundo: em 1974 vencendo o Brasil e em 1982 batendo a França. Mas a Argentina não tem nada com isso. Venceu com autoridade, mesmo o adversário não vendo a cor da bola. Assim, a Argentina ganha confiança, e confiantes são perigosos. E tem Messi e Di Maria, comandando um grupo de excelentes jovens. Inspirados, vão dar trabalho!
Fazendo jus ao título da postagem, a overdose de futebol apresentada na primeira fase da Copa do Deserto foi positiva. Mesmo os jogos ruins foram interessantes, pois são intensos em emoção, dramaticidade. E a festa que os sauditas fizeram depois de derrotarem a Argentina? Imperdível! Quanto a outros aspectos do evento, especialmente aquelas referentes ao atraso civilizatório ou vexames protagonizados por gente grosseira, entre as quais autoridades brasileiras, prefiro nem entrar no mérito da(s) questão(es). Tentar passar – como tentaram na abertura – uma imagem de harmonia entre mundos soou tão falso quanto as desculpas de certo deputado brasileiro que disse ter ido ao Catar entregar uns pendrives… Aí, é demais!
Contudo, que se considere a possibilidade de acontecer uma saudável surpresa e que uma equipe fora do clube seleto chegue a final e ganhe. Só pra fugir do óbvio. Se não ganhar o Brasil, que seja um azarão, mas que apresente um bom futebol e cale a boca do Kylian Mbappé! O craque francês, filho de pai camaronês e mãe argelina, disse que o futebol europeu é mais avançado do que o sul americano. (Mbappé , vá plantar batatas! Voce cometeu um leve deslize do tamanho da inchada Copa do Deserto ao confundir capacidade financeira e de organização com qualidade de futebol. Está mais que na hora da taça sair da Europa para não ouvirmos insanidades como essa!)
Kylian Mbappé é um craque! Teria lugar no meu time, o Santos, se ganhar a vaga do Soteldo e do Angelo!. Mas como analista futebolístico e social, um desastrado. Ele próprio, filho de camaronês e argelina, desmente a tese esdrúxula! É o mercado mais rico e organizado, isso é inegável. Mas uma equipe de futebol é mais que isso, ela se organiza levando-se em conta circunstâncias várias. Não é incomum que a própria história ou a organização social se reflita na equipe e no campo de jogo. Tradição é uma delas. O que o Brasil, Argentina e Uruguai construíram ao longo do tempo, nos autorizam a dizer que respeito é bom e gostamos! A velha frase – dinheiro não é tudo – entra em campo! É preciso algo mais. Talvez paixão!

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