FLASHES NO DESERTO

Se criticamos ferozmente os erros da Seleção Brasileira e do técnico, significa que nós, brasileiros, somos mal acostumados. Desde sempre.
Somos mal acostumados porque não somos obrigados a torcer pela seleção espanhola. No jogo contra Marrocos, foi de ficar espantado com tanta ruindade. Sofrível a equipe que um dia foi chamada “Armada Espanhola”. Dificil acreditar que a Espanha de Casillas, Xavi e Iniesta tenha regredido tanto. Retrocedeu a patamares anteriores, times que prometiam muito e nunca se concretizavam, tempos do goleiro Zubizarreta, do zagueiro Puyol, do meio campista Hierro, dos atacantes Fernando Torres e Raul e outros. Barcelona e Real Madrid estão entre os maiores times de futebol do mundo e seus elencos são formados basicamente de estrangeiros. Por si explica muita coisa…
A Espanha, que chegou ao seleto grupo de campeões do mundo graças a geração Xavi, Puyol e Iniesta empatou com Marrocos no tempo normal e na prorrogação. Um papelão. Teve mais de 70% de posse de bola… e daí? Dominio inócuo, insosso, sem objetividade. Se tivesse de ter um vencedor em campo, deveria ter sido o Marrocos, que nas poucas vezes que pegava na bola, tinha noções do que fazer com ela… O jogo foi para os pênaltis e o time do Luiz Henrique (que foi um bom jogador, mas sem grandes brilhos) perdeu com vontade! Se estivessem “determinados a perder” não o fariam com tanta “eficiência!”
O irlandes Keane criticou as dancinhas dos jogadores brasileiros em cada gol marcado contra a Coréia. Digamos que Keane não conhece a sociedade brasileira e o que significa futebol para nós. Não é segredo que a prática do futebol pode, em alguns casos, refletir o modo de ser de cada sociedade. Seria por isso que os holandeses utilizam aquele esquemas de “futebol total”, com o time se posicionando em blocos, ocupando espaços seja na contenção ou nos avanços, de modo que não interessa muito o “especialista” na posição, pois cada jogador desempenha várias funções? Algumas lendas procuram explicar esse comportamento dos holandeses em campo por conta da permanente ameaça de invasão pela água do mar, pois seu território está abaixo do nível do mar. O temor da invasão pelas água influenciaria o comportamento do holandês? Afirmar algo dessa natureza, é pano pra manga! Mas não descarto que seleções nacionais devam possuir características “nacionais”, daí o perigo de seleções serem formadas por estrangeiros naturalizados. Não é, obviamente ilegal, mas uma seleção assim seria destituída de alma. O jeito dos brasileiros comemorarem gols e a critica do irlandês Keane são posturas opostas, mas se explica por si: o irlandês acha normal fazer faltas violentas para intimidar o adversário; o brasileiro prefere dribles humilhantes. O meio termo, se houver, cabe ao árbitro.
Se incoerências existem com sobras durante esse torneio mostrado para o mundo inteiro com a eficiência de todo grande espetáculo, as mesmas acontecem no lugar certo, no longínquo deserto do Qatar: como conceber um ambiente/lugar onde a discriminação é tornada regra comum? Onde a misoginia, a homofobia é socialmente aceitável? Da mesma forma, a desigualdade é politicamente aceitável, pois assim é o mundo das ditaduras, mesmo que a força da grana tente nos fazer engolir que algum tipo de conciliação é possível com tanta distorção.
Nesse ínterim, desfila casualmente a cena dos “comedores de ouro”. Confesso que nem estava dando atenção a essa palhaçada. Mas na hora que fui confrontado com a cena, enchi-me de revolta e tristeza. Entretanto, desisto de tentar gastar palavras para tentar explicar/entender essa bizarrice. Não que o assunto não mereça que se fale dele, mas por mim só merece desprezo. Melhor ir passear no deserto – mesmo que seja simbólico. A escuridão gelada reflete outras escuridões, a da solidariedade. Na noite do deserto, se prestar atenção veremos flashes de luz que por um instante possam romper a densa escuridão e nos lembrar que existem flores e esperança!

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