A METRALHA NOS MATRAQUILHOS

A METRALHA NOS MATRAQUILHOS

O Brasil ganhou de 1×0 da Suíça. Um português trocadilharia: só isso? Pois o jornal luso “A Bola” hoje estampa em sua parangona, aliás, manchete: “Chocolate para os quartos”, enquanto o diário esportivo “Record” propaga: “Ramos faz história”. É, ontem foi a procissão de Ramos em Portugal, cuja equipa fez seis golos numa oitava de final.
Quando nós começamos a levar a sério o selecionado português?
Lembro-me de que, ali pelo começo dos anos 60, quando pela primeira vez visitei a cidade paulista de Lorena, onde moravam dois tios, ouvi, na grande varanda de meu tio Titita, um disco de piadas do Zé Vasconcelos em que ele irradiava, com sotaque lusitano, uma partida de futebol da seleção portuguesa que, apesar de estar levando uma balaiada, ao fazer um golo, merece todo estardalhaço do locutor: “Gooolo, gooolo, Portugal marcou um golo!” A entonação que o saudoso humorista dava era como se aquilo fosse um novo milagre de Fátima.
Porém, em 1966, Portugal caiu na chave do Brasil e foi o que se viu; perdemos de 1×3, depois de termos caído pelo mesmo placar diante da Hungria. Nossa compensação era que o técnico dos portugueses era o brasileiro Oto Glória. Hoje, quem diria, são os técnicos portugueses que dominam os grandes clubes brasileiros.
A partir daí, Portugal começou a ser respeitado nos campeonatos mundiais: na Copa de 2010 metralhou a Coreia por 7×0. Não vai demorar, assim como José Saramago recebeu o Nobel, os onze lusos poderão ganhar a Copa do Mundo.
Volto a enfocar 66, pois naquele tempo eu tinha um time de botão, feito de lentes de relógio, e cada uma delas trazia o nome de jogadores da seleção portuguesa. E aproveitei esse dado pessoal para criar uma cena de meu romance Um estranho no Minho, em que o narrador, por sinal chamado Roberto Mário (brincadeira com Romário e o fato de o romance ter sido escrito em forma de diário), ao entrar num bar, presencia a seguinte cena:
“Reparei que, no fundo do bar, tinha um joguinho de totó. Mas me espantei quando entraram dois jovens, dizendo ao homem atrás do balcão que iriam jogar “matraquilhos”. O amigo gordo, chamado Tojo, chegou até a mesa e ficou espiando os jovens disputando o pebolim. E o gordo ia dizendo: “ Xé Augusto lança para Coluna, este xoga para Xaime Graxa que passa a Euxébio… o Euxébio deixa xeguir a bola para Ximões, que finta três e manda para Euxébio e é golo!” Tojo foi interrompido por Grainha, que, imitando o sotaque galego e minhoto do gordo, falou: -“ Deixa os moxos, ó Tojo dos Tojais! Não perxebes que estais a incomodar?” Eu me amarrei naquela conversa. A Copa da Inglaterra, em 1966, me chegou clarinha na memória com aquela irradiação do gordo Tojo. Naquela época, eu tinha um time de botões com os nomes dos jogadores portugueses. Meu “Coluna” era um cracaço. Foi o único botão que vi, ao longo do tempo, ficar grisalho.”
Hoje, em Portugal, os gajos jogam matraquilhos e nomeiam os jogadores de Pepe, Cristiano Ronaldo, Gonçalo Ramos, João Félix, Rafael Leão… Ora, pois, pois; é chegada a hora de ouvirmos os rugidos das feras portuguesas.

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