Pai, ele é o melhor do mundo. Fez três gols, mano!
– Ele é bom mesmo, filho. Habilidoso, concentrado, criativo. Você sabia que ele tem um filho da tua idade?
– Tem? – sorriu.
– Tem.
– E ele joga bola?
– Parece que sim.
– Ele vai ser o melhor do mundo também, véi.
O pai se levanta para tomar água. De soslaio, olha para o moleque imerso no tablet e pensa naquilo que ele ainda não sabe sobre o craque português. Seria um bom momento para falar sobre isso? Sim. Nunca é demais falar sobre o que importa. Sair da superficialidade. Olhar para dentro. Imergir. Repudiar as máscaras que, por vezes, escolhemos usar. Se não as tiramos a tempo, porque pesadas, nos desfiguram. Fica outro rosto no lugar, que não o da infância. Que não esse que o pai, engolindo o último tiquinho de água, vê no menino.
– Filho, há algo que você não sabe sobre o craque português.
O menino, com 10 anos, tira o olhar do tablet para a vida.
– Duvido que você adivinha – desafiou o pai.
– Ele é o melhor chutador.
– Não.
– Os dribles.
– Também não. É alguma coisa que ele sempre demonstra no campo e carrega para fora do campo.
– Ele é o jogador mais forte.
– Não.
– Ele é uma das 10 pessoas no mundo com mais seguidores no Insta.
– Nada disso.
– Ele tem uma coleção de carros.
– Não.
– Ele jogou futsal quando era criança.
– Passou longe.
– Então não sei o que é.
– Eu disse que você não adivinharia.
– Tá. Desisto.
– A alma, filho! O craque português tem alma.
– O quê? Alma? Como adivinhar uma coisa dessas? Nem sei o que é isso! Você é muito estranho, pai.
O pai pega o celular.
– Vou te mostrar o que é alma.
Abre um vídeo. O menino inclina o olhar. Enquanto se desenrola a cena, o pai olha somente para o moleque, que tem os olhos vidrados na telinha. Vidrados.
– Que demais, pai.
– Entendeu, filho? Esse cara tem alma, tem coração. Esse garoto aí do vídeo deve ter tua idade. Você já imaginou que poderia ser você? Você gostaria que fosse você?
– Muito, mano.
– Viu o que ele fez? Desceu do ônibus, sorriu, abraçou o menino que chorava, tirou foto com ele, trocou um beijo…
– Autografou a camisa, pai.
– Também.
O pai pensou, mas não disse: “A alma do craque chama a atenção das crianças que o admiram tanto quanto seus gols e jogadas”.
– Pai, a gente pode ver de novo?