A crônica de hoje vai ser conduzida com a elegante companhia musical de Cartola. O Brasil enfim venceu, de forma dramática como nossos melhores sambas, com sofrimento, lágrimas e uma exultante alegria triunfal, tal qual apoteose carnavalesca.
Chora, disfarça e chora/ Aproveita a voz do lamento/ Que já vem a aurora.
Que todo o sofrimento dos dias, dos anos anteriores sejam expurgados nessas lágrimas, agora. Tudo o que te transformaram, queridinho da emissora e dos patrocinadores, monstro do Renê, alvo de cravas e bicos, desafeto dos árbitros, ator de drama mexicano, saltador olímpico, mimado, marrento, namoradinho da namoradinha do país. Tudo isso. Tudo isso não é você, Neymar. Disfarça e chora, e joga tudo isso fora, que já vem a aurora. Agora a Copa começou, agora só resta você, o menino e a bola.
A pessoa que tanto queria / Antes mesmo de raiar o dia / Deixou o ensaio por outra
Plantaram ilusões em você, Neymar, que você tudo podia, ser o astro, o centro, o único a brilhar no dia, e isso não é verdade. A bola, nesses dois primeiros jogos quis namorar outro, o Philippe, e você vai ter que aceitar isso, então disfarça e chora, e joga também essa ilusão pra fora.
Oh! triste senhora / Disfarça e chora / Todo o pranto tem hora / E eu vejo seu pranto cair / No momento mais certo
Ganhamos! Nos últimos minutos, com suor, meias rasgadas, empurrões e cotoveladas. E você desaba, ajoelha, as mãos no rosto, disfarça e chora. Essa é a hora. Lágrimas da vitória, do desabafo incontido, que só podia ser desse jeito, sem resmungos e queixas vãs, choro de quem superou em campo as botinadas e os comentários fáceis. Você não precisa ser gênio, um Pelé, só o menino e a bola. Então, fica aí no centro do campo mais um pouquinho, disfarça e chora. E quando se levantar, esteja mais leve e pronto pra amar outra, não as capas de revistas ou a tietagem tola. Só ela, a bola, ela que te merece.
Olhar, gostar só de longe / Não faz ninguém chegar perto / E o seu pranto oh! Triste senhora / Vai molhar o deserto / Disfarça e chora
E aprenda com Cartola, não fique longe dela, da bola. É ela quem você deve encantar, chegue perto, chame de meu bem, só não chore ao lado dela, que aí ela vai procurar outro, porque bola quer saber de alegria e gol. Tenha fé, é certo que você sabe tratar a bola, então não vai ter deserto, vai ter multidão e abraços, beijos e sorrisos. E lembre-se, precisando, disfarça e chora.