Não sei por aí, nas suas redondezas, mas por aqui houve quem dissesse que o Thiago Silva não merecia estar na Copa. Que ele devia ter sido banido da seleção (e do planeta) pra todo o sempre, junto com todas as 23 criaturas + membros da equipe técnica que pisaram em campo no 7 x 1. Afinal, onde é que já se viu um perdedor desse tamanho ter a chance de vestir nossa camisa outra vez depois daquilo. Hum?
Bobajada.
Thiago Silva nos representa. Pensa comigo: ele estava lá, no Mineirão, naquele 8 de julho. Na seleção que tomou um, dois, cinco… sete, se-te! Em terra brasilis. E desabou. Ele viveu – do banco, mas viveu – o seu (nosso) maior pesadelo futebolístico. E sobreviveu. Não só sobreviveu como se reergueu. Não só se reergueu como (pasmem) se fez melhor. E, sim, ele voltou. Deu (e tá dando) a cara pra bater – em full HD, hein. E tá enfrentando a sua (a nossa) dor fantasma diante do mundo inteiro.
Imagina o que acontece na barriga desse sujeito quando toca o hino?
Enquanto nós bancamos os técnicos, confortavelmente acomodados nos nossos sofás, breja na mão, churras no espeto, pipoca quentinha, Thiago Silva é o cara que se levantou no dia seguinte depois do fim do mundo e seguiu em frente. Deve ter perdido as contas de quantas vezes escutou: você é aquele da seleção seteaum, o que não pode fazer nada? Cara, que merda. Quantos risinhos por trás (e pela frente), quantos narizes torcidos, incontáveis piadinhas no aeroporto ou na fila do pão. Sei lá se ele fez terapia do grito, sei lá se ele tomou remedinho, escutou Wagner, escalou o Everest, foi ao terreiro ou à meditação transcendental. Mas quatro anos depois ele tá lá outra vez, e com a braçadeira de capitão. E não é figuração, não, ele fez por merecer. Mente quieta, espinha ereta e coração (aparentemente) tranquilo.
Convenhamos, Thiago Silva podia ter se aposentado depois do trauma. Podia, sei lá, ter se reinventado como escritor e lançado “Como sair do fundo do poço em 11 passos”. Ou virado palestrante motivacional “Método Thiago Silva para resgatar com goleada a autoestima”, sucesso de público. Quem sabe um quadro no fantástico “No banco com Thiago Silva”, com direito a charges de Maurício Ricardo. Ou ainda um treinamento empresarial: “O valor de um grande fracasso para um time de sucesso”, hein? Quem é do mundo corporativo sabe a importância do cara que traz na bagagem um projeto malsucedido. O mérito de quem já viu o mundo desabar e sabe prever os revezes, sobreviver às intempéries – essa dava até minissérie.
Olha que Thiago Silva poderia ter fundado uma comunidade alternativa para buscar o verdadeiro sentido da vida após a morte em vida (assim, bem dramático). Com direito a dreadlocks e variadas substâncias recreativas para expurgar os encostos – culpados por todas as goleadas da medíocre existência humana. Mas não. Thiago Silva fez a fênix, ó. Legítimo representante da espécie brasileira, o cara abraçou a dor, viveu o luto e voltou pro jogo, voltou melhor. #somostodosThiagoSilva, não?
Mas será que o Thiago Silva vai conseguir de fato exorcizar a sua (a nossa) dor fantasma nessa Copa?
Pena que essa história não é a gente que escreve – nem ele sozinho. Personagens incontroláveis (uns descontrolados) correm (e caem) pelo menos 90 minutos por episódio e o roteiro muda até conforme o árbitro de vídeo. Amanhã começa a nova temporada. Mas, olha, até se der errado, acho que pro Thiago Silva já meio que deu certo, viu. Ele pode montar uma consultoria. Começar no aeroporto de Moscou, magina? Já abre a lojinha atendendo as equipes da Alemanha, Argentina e Espanha.
Fica a dica, Thiago.