A gente até tenta se alienar do noticiário massacrante e repetitivo, das pautas sem imaginação que a imprensa em geral nos despeja, enquanto se prepara para faturar, junto com os patrocinadores, no maior espetáculo da Terra. Mas não tem jeito. De repente se aproxima a Copa do Mundo e a gente, quando se dá conta, já comprou o álbum, já cola as figurinhas com brilho nos olhos, já engole em seco ao ver ali postado o retrato do Daniel Alves, que não vai mais…
No penúltimo amistoso antes da estreia do selecionado canarinho no Mundial da Rússia, na manhã deste domingo, o primeiro tempo morno de um time sem criatividade deixou um travo de preocupação. A entrada de Neymar na segunda etapa, com toda a alegria de seu futebol, maior até que os estertores das costumeiras patriotadas televisivas, se por um lado anima, por outro confirma: sofremos de “neymardependência”. Sem ele, nosso escrete pouco tem a oferecer… Pelo menos contra adversários que marcam bem e não dão moleza para os brasileiros, como a esforçada Croácia.
Mas amistoso é amistoso e, como diz o filósofo Ronaldinho Gaúcho, “quando tá valendo, tá valendo”. Temos um bom time, bem treinado, cheio de autoconfiança, a torcida joga a favor, os bons resultados nas eliminatórias e nos preparatórios deixam sonhar com o hexa… Embora seja sempre bom não se contaminar pela euforia excessiva. Afinal, a prova dos nove vem agora, daqui a duas semanas, quando Tite trocar os gritos encenados nos anúncios de TV pelas instruções reais que poderão – ou não – fazer a diferença.
Pelo jeito o torcedor brasileiro já sabe que jogo é jogado e lambari é pescado. Que só o peru (e não o Peru, com Guerrero e tudo) morre de véspera. Que favoritismo e superioridade são coisas muito diferentes. Que as pedras no caminho podem ser numerosas, às vezes até sete num balaio só, por mais ufanismo que tentem nos vender. Já não vejo, como em outros anos, ruas pintadas, bandeiras, bandeirolas, nem a Bandeirantes de outrora. Tudo aplainado por traumas e pelo empobrecimento geral que nos assola.
Mas vem aí a Copa do Mundo, e não haverá crise crônica que nos tire aquele nó no gogó na hora do hino, aquela pérola de lágrima na contusão de um ídolo, aquela explosão de fogos, metafóricos ou de artifício, na hora de um gol. Futebol é nossa cultura, é o registro simbólico de nosso ser como povo, dessa gente de oito milhões de quilômetros quadrados e mil sotaques diferentes. Que venha!