– No meu time você não joga mais! – o grito assustou os jogadores, mesmo aqueles que estavam acostumados aos rompantes de mau humor de Tite, técnico da seleção brasileira na Copa do mundo do Catar.
Olhares atônitos seguidos por um silêncio sepulcral. O vocativo, ou seja, o sujeito receptor da ira do técnico era justamente a sua maior estrela: Neymar!
– Mas, professor…! –
– Não tem mas e nem mais! Cansei-me de suas exigências absurdas, de sua patota, de suas encenações. (Não quis dizer, mas tampouco engolia, as preferencias políticas de seu até então principal jogador). Basta!
O silêncio no vestiário pós jogo contra a Sérvia, estreia do time brasileiro na Copa de 2022 permanecia.
– Agora eu vou para a entrevista coletiva obrigatória. Sei que se machucou, mesmo que com menor gravidade. Não precisamos ser dramáticos, para todos os efeitos você está contundido.
Neymar, isolado, sem o consolo de seus “parças” ou muitos assessores, se desesperou em silêncio. Não era isso o que tinha em mente para esse mundial, talvez seu último! A dor que sentia era insignificante frente à decepção que agora o invadia. Encolhido no canto do vestiário que se esvaziava pensou no que fazer. Adorava jogar, é claro, e sabia que técnicos veem e vão. O problema maior são os enormes contratos de publicidade – tanto os permanentes quanto os motivados pela Copa. Há cláusulas que permitem a anulação dos mesmos caso não jogue por motivos de indisciplina ou extracampo. E agora? Seu pai certamente saberá o que fazer, ele sempre sabe!
Após as obrigatórias entrevistas coletivas quando, desolado, intensificou aos repórteres a gravidade de sua contusão, Neymar retornou ao hotel. Seu pai o esperava e já sabia do entrevero com o técnico. E, aparentemente, já tinha pronta a solução para o dilema:
– Você será seu sósia.
– Como é que é? Pai, sinceramente, dessa vez você se superou! Explica.
– Não se preocupe. Vamos torcer para o Brasil se classificar e nesse meio tempo eu “amoleço” o técnico. Sei de uma ou duas coisinhas a seu respeito que ele não vai querer que venham a público. Você vai voltar ao time!
– Pai, você é terrível, meu velho!
E assim foi feito. Neymar alternava-se entre o tratamento médico da contusão, que afinal nem era tão leve assim e as escapadas como “sósia”. No começo adorou, pois após tantos anos como celebridade mundial, poder andar quase anônimo era um privilégio e tanto. Óculos escuros, bonés e chapéus, tudo foi usado como disfarce. Mas, durou pouco. O problema é que nesses tempos de redes sociais e celebridades instantâneas, sósias também se tornam conhecidos. Numa escala menor, mas ainda assim, famosos. Não podia ir a lugar algum sem ser reconhecido como sósia de si mesmo e, acabou o sossego.
Numa prosaica visita a uma loja de shopping, a mesma teve que ser fechada devido ao afluxo de fãs do…dublê!
Paciência. As filas, os selfies, os apupos. Ser o sósia de si mesmo. Que ironia! Ainda bem que não sofre de transtorno de personalidade bipolar, ficaria por demais confuso. Mas, há também o lado positivo, como poder conhecer aquela linda torcedora brasileira que, acreditando ser ele o dublê, não será interesseira. Mas, aí, já é outra história…
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Cezar Fittipaldi
Escritor diletante, ourinhense de nascimento e coração, professor de escola pública, ex-empresário, eterno sobrevivente nesse país de desafios, encara a vida como uma gigantesca obra literária em tempo real. Seu esporte favorito é o automobilismo, gosta de basquete, atletismo, natação e o futebol já foi mais apreciado. Já assistiu a numerosas copas do mundo, todas pela televisão, e torce comedidamente pelo time do Brasil, sabendo separar ufanismo e nacionalismo de amor ao esporte.
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