“Em futebol há momentos que são exclusivamente poéticos: são os momentos do gol. Cada gol é sempre uma invenção, é sempre uma perturbação do código: todo gol é inelutabilidade, fulguração, espanto e irreversibilidade. Precisamente como a palavra poética. O melhor goleador de um campeonato é sempre o melhor poeta do ano.”
Quem escreveu essas palavras era um apaixonado pelo futebol. O cineasta italiano Pier Paolo Pasolini. Disse ainda que existe o futebol poesia, como o brasileiro e o futebol-prosa, o europeu. E que no México, em 1970, “a prosa estetizante italiana foi vencida pela poesia brasileira”.
De lá pra cá, muita coisa mudou. A prosa europeia e a poesia latino-americana foram batidas num liquidificador e nessa vitamina, além do futebol, também entraram muito dinheiro, política, poder, imigrações… Tudo isso fez com que os onze louríssimos que formavam o Carrossel holandês da década de 1970 sejam hoje negros ou árabes ou louros ou morenos ou… E faz também com que garotos da periferia do planeta voem non stop de suas favelas para o Barcelona ou outro rico clube europeu. E esses ricos clubes europeus, que compram o Terceiro Mundo, vão sendo comprados por magnatas árabes que não entendem nada de futebol, democracia, direitos trabalhistas ou femininos, mas compram como ninguém. Aliás, compraram uma Copa do Mundo e é por isso que estamos aqui conversando.
“Aqui” é em Doha, no Qatar, onde eu, o Alexandre (que não é o de Moraes e sim o das letras, o Brandão) e meu cachorro, o Feola, que tem complexo de gente, estávamos ainda ontem num barzinho, bebendo mais uma rodada de água quente e discutindo a Copa. Empolgado com o fim da fase de grupos, Alexandre gritou: viva o mata-mata! Na mesma hora a polícia do Emir invadiu o bar e matou 3 garçons, o cozinheiro e dois australianos. O que há com essa gente que não consegue entender uma metáfora?
Transferimos nossa mesa-redonda para o barzinho do hotel. Lá a água quente é bem tirada e a polícia do Emir se contém e só atira do joelho pra baixo. Mas voltemos à Copa. Feola acha que a grande favorita já saiu: a Espanha. Eu e Alexandre caímos na gargalhada. Feola não gostou, mordeu a canela do Alexandre e fez xixi na minha sandália. O convívio aqui no Catar não está fazendo bem a ele. Eu e Alexandre somos da mesma opinião: o tal tiki-taka que a Espanha inventou tem uma única função: aborrecer o adversário a tal ponto que ele caia no sono. É a chance da Espanha, pé ante pé, fazer um gol. Não é a toa que foram campeões do mundo em 2010 fazendo 8 gols em 7 jogos. Perdulários! Podiam ter guardado um golzinho pra fazer agora no Marrocos.
Mas quem também está numa enrascada é o Fernando Santos. Tirou o craque do time e Portugal meteu 6 golos (como eles dizem) na Suíça. Fernando já pode pedir duas músicas no Fantástico e uma conta numerada na Suíça. Mas e nas quartas de final? Barra o Gonçalo Ramos com seus 3 golos? Ou barra o CR7?
A seleção brasileira é a mais econômica de todas. Em cada partida joga só um tempo. Contra a Sérvia foi o segundo, contra a Coréia, o primeiro. Contra os Camarões, com os reservas, exagerou e não jogou hora nenhum. Resultado: foram os Camarões que nos fritaram e engoliram.
Até agora há uma única unanimidade: Mbappé é o craque da Copa. E aqui na nossa mesa esportiva temos outra unanimidade: onde está a polícia do Emir que não prende essa criatura?
Está certo, é uma medida muito violenta. Mas o futebol é assim: tira completamente a gente do sério, a ponto de deixar a Fifa organizar Copas do Mundo! E logo aonde? No Qatar!
Mas vocês sabem, aqui no Katar, as saias das mulheres e a inteligência dos homens têm que ser usadas abaixo dos joelhos.
Compartilhar:
Cesar Cardoso
Carioca de 1955 e torcedor do Fluminense, comecei a acompanhar Copa do Mundo em 1962, aos sete anos. Fiquei apaixonado pelo nome de um país: Tcheco-Eslováquia! No jantar em família, declarei que ia torcer por ele. E tomei um esporro do meu pai: vai torcer pelo inimigo, sua besta? Foi a primeira crítica ao meu trabalho como comentarista esportivo. Mais tarde, escrevi no jornal O Pasquim, fazendo uma cobertura humorística da Copa de 1982. Aquela, que deu no Desastre do Sarriá, com a Itália ganhando da gente de 3 a 2, lembram? Não? É, é melhor esquecer mesmo. Falando em esquecer, ia esquecendo: sou cronista, contista, poeta, roteirista e autor de literatura infanto-juvenil, com mais de 20 livros publicados e mundialmente conhecido por toda a minha família. Desde que a pandemia começou, apresento nas redes o programa
digital Poesia Prato do Dia, onde falo e comento poemas, crônicas, contos etc (olha o link aí: https://www.youtube.com/user/cesarcar55).
E agora vamos à Copa do Mundo Feminina.
É a hora dos manu torcer pras mina!
Todas as crônicas do autor
Curta nossa página no Facebook e acompanhe as crônicas mais recentes.
Crônicas Recentes.
Joca
22/08/2023
Caio Junqueira Maciel
21/08/2023
Maria Alice Zocchio
20/08/2023
Fátima Gilioli
20/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
20/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
18/08/2023
Marcelo da Silva Antunes
15/08/2023