O FILHOTE DAS COPAS
A primeira Copa do Mundo a gente sempre se esquece: ele só tinha três anos e não há de se lembar de 1974, quando o Brasil foi despachado por 2×0 daquela fenomenal Holanda.
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Em 1978, já crescidinho, ele ganhou de seu tio um time de futebol de mesa do Brasil. E começou a prestar atenção nos jogos, mas viu a Argentina ser campeã, enquanto a Seleção saía invicta, em terceiro lugar.
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Em 1982 ele já estava entusiasmado com o time do Telê, e deixou entre parênteses a sua paixão pelo Botafogo. Porém, aqueles gols do Rossi jogaram gelo na cerveja – não que ele fosse de beber, deixava isso pro seu pai, apelidado de Rato Branco. E foi a partir daí que ele, a quem chamo de Fióte, começou a fazer contagem regressiva para os dias que faltavam para a próxima Copa.
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Em 1986, seu ídolo era o botafoguense Josimar. Mas os pênaltis perdidos por Zico e Sócrates fizeram com que a Seleção Brasileira saísse à francesa…
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Em 1990, o Fióte deixava a cidadezinha do interior e viera trabalhar no Zoológico de Belo Horizonte. Ele sempre gostou de animais, imita alguns com perfeição. No Zoo, atormentava o gorila que tinha nome de Idi Amin. Mas ficou de olho na Copa e viu Maradona e Caniggia mandarem a lazaronenta seleção de volta para casa.
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Em 1994, o Filhote também estava de volta para casa, no interior. E lá vibrou com os gols do Romário e Bebeto, vendo, pela primeira vez, o Brasil ser campeão do mundo. E nessa época tinha uma coleção de tabelas, preenchendo todas, assim com álbum de figurinhas.
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Em 1998, perdeu o avô Juca, por sinal meu pai. E viu o Brasil perder desastrosamente da França, por 3×0. Mas continuou a contar quantos dias faltavam para 2002.
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Alegria total nas madrugadas deste novo século: viu o Brasil tornar a ser campeão, com o Ronaldo Fenômeno.
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Quem se lembra direito das Copas de 2006 e 2010? Fióte colecionou decepções, embora a chegada da filha Ariadna o distraía das amarguras futebolísticas, incluindo o fraco desempenho do Botafogo, que desde 1995 não ganhava um Brasileirão.
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Fióte veio a BH e viu, na Praça da Liberdade, um relógio seu concorrente, que fazia a contagem regressiva para a Copa. E, depois, rasgou todas suas tabelas depois do vexame dos 7×1, em 2014. Foi no Mineirão, ainda por cima, não muito distante do Zoológico. Fióte, para livrar-se das chateações, passou a frequentar certas localidades a que ele chama de Barulho, ou mineiramente “baruio”.
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A coisa ficou russa em 2018, com o futebol belga enxotando a Seleção Canarinha. Mas Filhote tornou a fazer sua contagem regressiva.
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Em 2022, famoso em sua terra por ter se apresentado num programa de Yutube, imitando animais, e já passando dos 50 anos, ei-lo com as tabelas na mão, mas Fióte tornou a se decepcionar com o Brasil fora dos jogos finais. Mas já sabe que a contagem regressiva será menor, três anos e meio para a Copa na América do Norte. Só não quer ver o Brasil cair nas Otawas.
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É tempo de explicar porque apelidei o Ricardo Mori Ferreira de Filhote. Quando menino, nas brincadeiras que eu inventava, fingia que era um vampiro ou um gorila e corria atrás dos sobrinhos no velho casarão da tia-avó Baiá. Eu dizia: Sou o King Kong, e ele, pertinho de mim, dizia: eu sou o fióte.