Nada de ser condescendente. Antes, durante e depois o que existe é um machismo escancarado. É verdade que a gente dá uns dribles – a palavra vem a calhar –, se esconde aqui e acolá, lava louça, procura ser cortês, busca respeitar as mulheres, mas, quando o assunto é futebol, lá se vai a nossa máscara – outra boa palavra pro contexto.
Se me mandam falar o nome de duas jogadoras de nossa seleção, arrisco Marta (risco zero) e Formiga, uma insensatez, haja vista que se aposentou. Não dá para fugir pelas beiradas feito um ponta ou um falso ponta, dizer que não acompanho porque o time feminino do Botafogo não está nas cabeças. Ó, céus, torço pelo masculino nos seus piores momentos. O leitor, a leitora, principalmente ela, se houver, podem se manifestar nas redes sociais e cancelar esse que lhes escreve. Roubo um poema do Torquato Neto e digo: “eu brasileiro confesso minha culpa, meu pecado”.
Essa besta-fera, euzinho da silva xavier, sentou-se no sofá às 7h45 minutos do dia 24 de julho de 2023. Na noite anterior, havia tomado umas cervejas com amigos, e duas noites antes, sentira saudades de sua mãe, que faria 100 anos. Enfim, o ressacado e tristonho ligou a televisão, viu as atletas entrarem em campo e perfilarem para o hino. Ele não olhou com olhos de homem as jogadoras, o que, na perspectiva de machista fora do armário, soa estranho. Além disso, quando começou a execução sofrível do hino, ele quase teve um trem (sim, o cronista é mineiro).
Passou a prestar atenção no jogo, e o que era aquilo? Apesar do time fraco do Panamá, a equipe brasileira jogava como se estivesse apostando a vida. Bola pra cá, bola pra lá, inversão de jogada, entrada pelas laterais, tabelinhas. E ninguém caía, e ninguém dava chutão, e ninguém simulava falta. Meu Deus, eu estava vendo um jogo de futebol. Dos melhores.
Vieram os gols. Após o primeiro, o choro da Ary Borges, aquela que, vencida a emoção inicial, enfiou mais dois e fez o passe mais lindo dos últimos tempos. Não só o passe, a jogada foi uma pintura. A bola espichada cai nos pés de Debinha, que, depois de tabelar com Adriana, cruza para Ary. Esta poderia ter chutado, mas preferiu, de calcanhar, passar a bola para Bia Zaneratto, que não perdoou. A seleção brasileira feminina cultiva a solidariedade, o que parece ser a essência do esporte.
O pobre machista saiu do sofá, tomou um copo d’água, sentou-se defronte ao computador para dar início ao dia de trabalho. Quem foi para o sofá era um homem, o que saiu de lá, outro. Se todas as forças espirituais e esportivas ajudarem, o do pós jogo, bem melhor e menos preconceituoso, triunfará e mais uma aresta machista será limada de sua personagem complexa.
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Alexandre Brandão
Alexandre Brandão, contista, poeta e cronista, apesar de nascido em Minas Gerais, é botafoguense, time que ainda é aquele que mais craques cedeu à seleção masculina de futebol. Essa característica o impele a escrever de pernas tortas ou feito um furacão. Como muitos brasileiros, Alexandre está um pouco de mal do escrete canarinho, mas isso, apostam seus filhos e a torcida do Flamengo, não vai durar até o início do primeiro jogo. De toda forma, as seleções africanas, de Portugal e até a da Argentina estão, diga-se assim, de stand by para uma ocasional torcida.
Foto: Helena Brandão
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