Difícil esquecer que sou publicitária na hora dos jogos da Copa. A primeira coisa que vejo na tevê são as mensagens que circundam o campo, algumas em palavras que desconheço e adoraria desvendar.
Um design sinuoso dá leveza às letras asiáticas. Serão vogais ou consoantes? Termos compostos, adjetivos, substantivos? Mas logo aparecem as letras russas trazendo a lembrança dos cartazes da revolução criados por Maiakovski e suas legendas poéticas, a plenos pulmões.
Pronto, outra imagem me distrai: a animação do automóvel, que corre nas laterais enquanto a bola voa. E depois o tênis, que dá um rasante campo afora ao mesmo tempo em que chuteiras pisam calcanhares, ferem tornozelos.
Foi gol? Não vi. Espero o replay. E, no detalhe, dá pra ver os pontinhos do painel criando uma ilusão de ótica. Foi gol, sim, da Nike contra a Adidas.
Penso, então, que apesar das marcas globais e da cultura-mundo, a palavra sempre precisa de tradução, diferentemente do olhar triste do menino no colo do pai, ao ver o Peru perder. Ou da alegria contida dos japoneses. Do sorriso das iranianas. Ou da beleza colorida da torcida senegalesa.
Mesmo na copa, difícil esquecer que sou poeta.
(Na imagem, as palavras de Maiakovski desenham um trecho do poema “Revolução Poetocrônica”. No título, final de “O Bilhete do Suicida”, a despedida do poeta).