TRISTEZA DO CÃO.

Cachorros são bichos sensitivos. Absorvem os sentimentos das pessoas que os amam.
Passei um fim de semana jururu, quieto no meu cantinho. Achei que a tristeza da eliminação do Brasil na sexta feira fosse passageira. Afinal, sou um sujeito – assim suponho – maduro, equilibrado, com uma certa experiência para entender que a vida é feita de frustrações e realizações, avanços e revezes, conquistas e fiascos, dores e delícias.
Mas sentimento é sentimento. Não se varre para debaixo do tapete nem se chama para uma DR. Vive-se.
Nem mesmo as quartas de final de sábado serviram para amenizar a dorzinha chata e insistente. Muito pelo contrário. Assistindo ao Inglaterra X Suécia, e ao Rússia X Croácia, revendo lances da nossa derrota – e por masoquismo o próprio VT inteiro – acentuou a tal fisgada no coração combalido, sintoma que me diz que terça feira poderíamos muito bem estar disputando uma semifinal. Perdemos para Bélgica, sem dívidas com o futebol.
Houve um gol, que a memória não me ajuda e a covardia me impede de conferir no Google, idêntico ao quase gol do Renato Augusto já nos minutos finais do jogo. A diferença foram centímetros da trave para o lado de fora. No outro, foram os mesmos centímetros só que para o lado de dentro, longe da mão do goleiro.
Revejo recorrente a bola na trave do Thiago Silva no primeiro minuto de jogo. Revejo o Brasil impetuoso, guerreiro e dominante do segundo tempo, os lances perdidos, alguns pífios, e outros tantos que consagraram o comprido Courtois como um dos melhores goleiros que vi nesta Copa.
Não se trata de chororô. É apenas uma constatação consciente de que quem manda no futebol é a bola. E a bola sexta feira não nos deu bola.
Nada de apontar culpados dessa vez. Ninguém ajeitou o meião displicente para a França nos eliminar em 2006. Ninguém provocou uma expulsão merecida para a Holanda nos mandar para casa em 2010. Ninguém se entregou em campo como nos 7 a 1. Nem mesmo a arbitragem cega diante da camisa rasgada do Zico na área italiana no finzinho do fatídico jogo de 82.
Nada de culpados condenados às masmorras dessa vez. Apenas erros de marcação e afobações, caprichos inerentes ao bom esporte bretão. Vida doída que segue. As ótimas seleções da Bélgica e da França prometem um
jogaço na terça, não perco de jeito nenhum, porque Copa do Mundo é espetáculo soberano.
Tive um tio que não ligava para Copas do Mundo. E dizia: “ficar triste por causa de futebol é coisa de gente que não tem problema.” Tenho vontade de dizer para ele, onde quer que ele esteja nos cafundós da eternidade, que não tenho problemas com a vida. Acredito que a felicidade venha em pílulas homeopáticas, alternando com um ou outro xarope de amargos momentos. Meu pote dos comprimidos bons sempre esteve cheio e renovado, enquanto o vidrinho do tal xarope de gosto horrível está lá na prateleira, me convocando vez ou outra em situações de adversidade, frustração, indignações com a (in)civilização destrambelhada chamada Brasil – sem escrúpulos, sem cidadania e sem vergonha – , trapaças do destino ou mesmo erros que a gente comete. Ou que outros cometem e nos atingem, querendo ou sem querer querendo. Natural e humano que seja desse jeito, o mundo e seus homo sapiens não são pródigos em fazer cafuné.
Bem sei disso.
Apesar das amarguras pontuais, contrariando meu tio, acho que sou um sujeito particularmente de sorte. Meu pote de felicidade nunca se esvazia.
Mas que estou triste, estou.
Meu cachorro não me deixa mentir.

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