A COPA DO MUNDO É NOSSA.

Não, não se trata de um rompante ufanista e arrogante, na véspera de um jogo contra o misterioso e traiçoeiro México.
Talvez o chili de amanhã nos caia indigesto, talvez não.
Talvez teremos na próxima sexta uma intoxicação de chocolate belga, ou sejamos, depois de nadar, nadar e nadar, atropelados por uma barca de sushi na praia.
Pode ser que sim, pode ser que não.
Um botafoguense legítimo não teria a ousadia irresponsável de prever um triunfo, principalmente depois de assistir à talentosa França e ao poderoso
Uruguai, abrindo as oitavas de final e fechando as portas de dois virtuoses solistas da bola.
Cristiano Ronaldo deve estar exibindo suas coxas para algum escultor contemporâneo. Messi, um náufrago numa ilha deserta trocando passes com coqueiros, como sempre foi e fez nos estádios da Rússia.
Repito: é possível que o time Brasil até fique pelo meio do caminho. Tóc, tóc, tóc. O sarrafo está muito elevado dessa vez.
Mas digo feliz que a Copa do Mundo na Rússia já tem um vencedor: nós.
Nós, que amamos a arte do futebol.
Nós, apreciadores do artista em movimento.
Nós, que degustamos o que sommeliers dos gramados nos oferecem.
Nós, que nos curvamos ao futebol em estado de arte.
Nós, que não procuramos explicações ou juízo para o fascínio inexplicável.
Somos uma plateia de privilegiados diante do espetáculo do imprevisível. Somos sensíveis à beleza do arco desenhado por um passe longo, às tramas de um drible curto, às pinturas de várias jogadas, à mudança de enredo causada por um desarme, ao balé da triangulação de um contra-ataque fulminante, à súbita parada da bola dentro do gol. Ou à suavidade de seu gesto quando cai de mansinho na rede.
É como se gritássemos bravo! a cada defesa de um goleiro ou morremos de rir diante de um vacilo de um bufão.
Foram tantas as performances de aplaudir de pé, adrenalina aos píncaros e queixos no chão, que é impossível e enfadonho descrevê-las aqui.
Só no primeiro dia dessas oitavas de final foram 10 gols, em sua maioria obras-primas do talento, da rara inteligência espacial, dos enxadristas de campo aberto, dos desafiadores dos limites do corpo e nada mais.
Cavani, Suarez e Mbappé, só para citar três dos mestres da arte da bola, encantaram e encantarão até meus ancestrais na eternidade lá no Céu.
Entendo e respeito do fundo das minhas cárdio-entranhas os que não gostam de Copa do Mundo, independentemente das razões e emoções. Ora acham futebol algo de panis et circenses, (cada vez mais circo, cada vez menos pão); ora porque o enxergam como manobra menor para esconder desgramas maiores; ora como um grande negócio da opressão capitalista – um reality-show-business de mercenários e avarentos; ora porque acham simplesmente o tal velho esporte rude e bretão sem graça, chato mesmo.
Compreensível. Há gosto e desgosto para tudo. Cada um que tenha os seus. Copa a gente sente dentro da gente. Mas, mais uma vez nestas Crônicas da Copa, peço licença para parodiar Vinícius de Moraes: “os indiferentes que me perdoem, mas a beleza do futebol é fundamental.”

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