Brasil e Principado de Liechtenstein na final

Não é a compaixão que impele o ser humano a torcer pelo time mais fraco. Na compaixão somos movidos a fazer algo concreto pelo necessitado. À comoção midiática em solidariedade ao time pequeno ou a uma nação pobre trazida pela Copa do Mundo chamamos de emoções baratas. Derramamos fortuitas lágrimas e pronto: o esboço de catarse torna-se suficiente, cumprimos nossa adesão, nosso respaldo e podemos retomar o riso (e a nossa cerveja) como se todos os males do mundo tivessem sidos extirpados.
Por que queremos a Nigéria e não a Argentina? Porque os nigerianos são negros da África oprimida? E por que torcemos pela Suécia e não pela Alemanha? Suécia está longe de ser oprimida; a população é formada por loiros de olhos azuis. Por que vibramos pela Coréia do Sul – outro país rico?
Neste caso, a resposta parece simples: nosso orgulho ferido pelos 7 a 1, em casa, nos fazia tremer ante a possibilidade de encarar a esquadra germânica. Sendo assim, torcemos pelo time que nos der menos trabalho – lei do menor esforço. Ora, não tem graça ganhar o Mundial passando por Suíça, Costa Rica, Sérvia e, agora, México – times de terceiro escalão. Que graça teria a festa depois de o Brasil ganhar a Copa em uma final contra a Tanzânia?
Se continuarmos a torcer contra os fortes, corremos o risco de em futuro bem próximo termos excitantes finais entre as seleções de República do Congo e Haiti. Ou Terra do Fogo e Aruba. Ou ainda Cazaquistão e Ilhas Malvinas. Impossível? Olhe o estrago que a Islândia (quase) provocou na Argentina. Ocorre que a Fifa pretende ter 48 seleções no mundial de 2026. Vai aparecer seleção até de país que não existe.
Há dois elementos importantes nessa nossa guerra contra os poderosos e a favor dos pobres e oprimidos (nem tanto assim, como se vê na Suécia e Coréia do Sul). Primeiro, ao extravasar nossas emoções baratas fazendo-a passar por compaixão cremos ter cumprido nossa obrigação social e referendado nosso discurso político. “Quero que a pobre (mas digna) e revolucionária Argélia mande a rica e reacionária Alemanha para casa” – a Argélia quase eliminou os alemães em 2014.
Segundo: diz-se que tudo é político. Há exagero em todas as generalizações (inclusive esta). Em princípio, Copa do Mundo não é instância política, ainda que ela se valha da política, da economia, dos lobbies e dos interesses de quem está no poder. Mas, como no carnaval, fingimos que está tudo bem e nos apossamos do espírito de Carmem Miranda, mesmo sem saber nada de Carmem Miranda.
Uma coisa é certa: mesmo sendo político, nesse carnaval globalizado não dá para levar a sério essa disputa entre pobres e ricos e, o melhor, talvez seja ficar no clima da festa. Sendo assim, eu queria que Krool continuasse, assim como torço para que Cristiano Ronaldo, Messi e Iniesta, entre outros, cheguem o mais longe que puderem. Eu queria uma apoteótica final contra a Alemanha. Há quem prefira Brasil e Principado de Liechtenstein em uma (imagina-se) arrebatadora decisão de Copa do Mundo. Em 2018 será impossível. Quem sabe em 2026.

Compartilhar:

Curta nossa página no Facebook e acompanhe as crônicas mais recentes.

Crônicas Recentes.