Copa a copa

Seu olhar atravessa a vidraça e aterriza na copa de uma árvore do pátio. Seus ouvidos atravessam minha voz de professora e atentam para a Copa acontecendo nos pés de um ou outro jogador, que atenta quase que exclusivamente para a bola, sem dar atenção à voz do juiz.
Não importa tanto o jogador ou a cor de sua camisa. Se ele coloca a redondinha pra girar, o Brasil para pra lhe ver passar. E é fácil notar que enquanto a bola gira tudo gira em torno dela – olhos, corpo, mundo… Mas será? O mundo continua girando em órbitas paralelas, alguns olhos ainda giram até achar copas de árvores para pousar, outros – como os meus de professora em sala de aula – giram controladores em torno dos alunos até aterrizar nessa aluna com olhos e ouvidos em copas. Peço que desligue o celular e aterrize de volta na sala de aula. (Não é aterrisse, com dois ésses, professora?) Mas é a Copa, pro! Tento argumentar que nem é jogo do Brasil, que ela precisa fazer a atividade, sair da internet pra se concentrar. Não é internet, pro, é rádio! E eu tô ouvindo mas tô fazendo a lição!
A palavra rádio me seduz tanto que quase não consigo disfarçar a vontade de sentar pra ouvir com ela o jogo. Como quando eu era criança e sentava com meu pai, ouvidos bem abertos, o rosto da foto do álbum de figurinhas ganhando movimento, emoção a cada drible, visão muito mais perfeita da jogada do que a que hoje costumo ter pela tv. É, a gente se acostuma com imagem pronta e não percebe que passa a ver tão pouco.
Quem está jogando? Pergunto e entrego meu jogo. Não posso mais com isso de driblar essa paixão tão genuína da garota que um dia fui eu. Aterrizo professora e dou asas à menina.

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